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Paixão por equipes de futebol em outros estados tem o empurrão da mídia, apontam especialistas
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Publicado em 17/04/2019

 

Por Nando Silva

16/04/19 23h53

 

Não há de desprezar que os meios de comunicação estão em todos os lugares e  fazem parte da vida do indivíduo.  No trabalho, escola e em reuniões com colegas, a população brasileira fica antenada em tudo o que acontece ao seu redor através de contato com os veículos comunicativos ou por intermédio de amigos. Em se tratando de futebol, o mundo se encantou com a seleção brasileira no Mundial, que trouxe o tri-campeonato no México, com Rivelino, Carlos Alberto Torres, Jairzinho e Pelé. Por outro lado, os fracassos também marcam a história. A derrota acachapante do Brasil diante a Alemanha na Copa de 2014, recebendo sete gols em plena casa foi transmitida a nível mundial. Em ambos os casos, o triunfo e a vergonha numa Copa do Mundo foram divulgados a partir do que se tinha disponível em cada período, em particular, rádios e jornais impressos (1970), e televisão e internet (2014).

Mas de certa forma, clubes fora do eixo Rio- São Paulo, como na Região Norte e Nordeste do Brasil, atribuem a ligação da mídia e a união dos próprios genitores na construção da paixão por um time fora de seu estado de origem. O enfermeiro, Jucélio Donato, 28, morador de Guanambi, sudoeste da Bahia, afirma que o amor do seu pai ao clube foi importante na sua identificação ao Flamengo, equipe tradicional do futebol brasileiro. Porém, Donato afirma que a mídia, de certa forma também relacionou a sua paixão ao clube nacional. “O que me motivou mais foi concerteza a familiaridade que meu pai tinha ao clube. Ele era torcedor do Flamengo. A mídia, como a televisão e o rádio, elas têm uma importância nisso, porque quando fala o Flamengo é o maior do Brasil, tem a maior torcida, maior campeão carioca, aquilo influencia, querendo ou não, na torcida de outra cidade”, destaca.

 

Jucélio Donato é nordestino e torcedor fanático do Flamengo - RJ, uma paixão estampada no peito há 28 anos, desde o seu nascimento.

Foto: Arquivo pessoal

 

Mas a queda de produção e o amadorismo, ou seja, treinamentos realizados aos sábados, domingos e, sem remuneração, foram fatores decisivos na migração de torcedores para clubes de outros estados, como Rio de Janeiro e São Paulo, é o que afirma o historiador esportivo e escritor de Manaus, Gaspar Vieira Neto. Segundo ele, tampouco havia a figura do técnico como comandante de um time, algo que só aconteceu depois da profissionalização do esporte, a partir de 1930, no sudeste. Mas houve lugares em que o futebol como profissão veio tardiamente. No estado do Amazonas, por exemplo, isso só aconteceu em 1964.

Para se ter uma idéia da força de um time longe de suas sedes, o Datafolha, site especializado em pesquisas de opinião, destacou que Flamengo liderou no Nordeste, em 2018, o amor pelo time do coração. A equipe carioca conquistou 23% dos torcedores e o Corinthians, 9%. A nível nacional, o rubro-negro continua na frente, com 18% de preferência, diante 14% do Timão. Esse resultado mostra uma repetição do que aconteceu em julho de 2014, quando a pesquisa havia sido realizada.  Completam a lista dos 5 primeiros clubes: São Paulo (8%), Palmeiras (6%) e Vasco da Gama (4%). Algo expressivo, visto que equipes tradicionais do Nordeste, como Vitória e Bahia atingiram apenas 1%, cada, na preferência das maiores torcidas do Brasil.

Gaspar Neto ainda destaca que, no Amazonas, a opção dos torcedores por times de outros estados foi ainda maior devido também a casos de corrupção, migração dos principais atletas, além da criação do Clube dos 13. “Quando o futebol começou a entrar em decadência, aqui, no início da década de 90, os torcedores abandonaram seus clubes e se voltaram para os times do sudeste, devido a influência da mídia, e foram passando esse gosto para filhos e netos”, afirma. Segundo o especialista, a transmissão de campeonatos estaduais do sudeste no Norte do Brasil foi outro fator preponderante.

Já o professor Elias Abensur, 50, de Manaus, optou por outro clube que não fosse apenas do Rio de Janeiro. Até 1997, era torcedor do Flamengo-RJ e do Fast, time da quarta divisão nacional. Segundo ele, após este período só a paixão pelo time local prevaleceu. “Eu era misto. Fast, no Amazonas e Flamengo, no Rio. Como a maioria dos manauaras, torcia para dois clubes”, afirma.  Elias diz que o amor pelo time veio depois de jogos históricos de seu atual e única equipe, o Fast. O professor recorda de duas partidas em que o Fast esteve atrás do marcador e virou a partida sobre o Nacional, o maior rival. “Uma em 1984, em que a equipe manauara perdia por dois a zero e virou para três a dois. A outra foi em 2009, quando perdiam por três a zero e virou para quatro a três. Sete anos depois, acabou um jejum de quarenta e cinco anos sem título amazonense”, recorda.

O sociólogo de São José de Rio Preto, interior de São Paulo, Antônio de Azevedo Júnior, salienta que a vida do homem em sociedade se dá por várias influências, ligadas a gostos e preferências à um time de futebol. Junior afirma que a família tem grande importância nesse processo, em especial, os de sexo masculino, como tio e avô, mas ressalta também o papel da mídia.  “Há muitas pesquisas sobre quantidade de torcedores por time que apontam o crescimento de uma torcida num determinado período e, não raro, coincide com o período vitorioso daquele time ou mesmo a presença de um jogador “da moda” naquele time; essa maior evidência - visibilidade midiática, também ajuda a construir a identidade do torcedor”, frisa. O também professor aborda o consumismo de produtos que carrega o nome das equipes.

Junior destaca que a popularização dos torneios internacionais foi destaque para o surgimento de mais torcedores de clubes estrangeiros, como Real Madrid, da Espanha. “Por fim, não vejo nada de prejudicial em se torcer para um time, pois o conteúdo alienante desse processo (como em tantos outros, novelas, por exemplo) pode e deve dialogar com o senso crítico do indivíduo”, finaliza.

Os times brasileiros buscam o seu espaço através de resultados positivos e uma boa qualificação no ranking da CBF, a Confederação Brasileira de Futebol, principal órgão representativo da modalidade no país. Uma posição de destaque seria a classificação para um torneio de nível nacional, como a Copa do Brasil ou a primeira divisão do Campeonato Brasileiro, realizados anualmente. Apesar de estar na série D do Brasileirão, o rolo compressor, apelido carinhoso do Nacional Fast Clube, teve participações na primeira divisão nacional, em 1977, além de conquistar o título estadual em 2016.

 

Clube dos 13

Criado em 11 de julho de 1987 com o propósito em auxiliar nos interesses dos times com maior renda nos jogos pelo Brasil, o Clube dos 13 era composto por Fluminense, Flamengo, Botafogo, Vasco, São Paulo, Santos, Corinthians, Palmeiras, Grêmio, Internacional, Atlético Mineiro, Bahia e Cruzeiro. O objetivo era realizar um torneio semelhante ao Brasileirão de futebol, de forma que os times não fossem prejudicados e houvesse a negociação dos direitos de transmissão em televisão e rádio. As equipes alegavam que, em confronto com os times de menor expressão, os maiores pagavam a conta. Após a criação do Clube dos 13, a Copa União foi criada e os módulos foram aperfeiçoados. Com o passar dos anos, o torneio foi composto por 16 times. O vencedor e o vice de cada grupo se enfrentariam, definindo o campeão do torneio e mais dois representantes brasileiros na Libertadores do próximo ano, principal competição de clubes na América do Sul. Em 1988, com o retorno do Campeonato Brasileiro, os direitos em transmitir as partidas continuaram a ser discutidas.

 

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